Sunday, July 27, 2014

Discurso das comemorações dos 15 anos de aniversário do Pavilhão do Conhecimento


Foi ontem à tarde, no Pavilhão do Conhecimento, no discurso das comemorações dos 15 anos de aniversário do pavilhão do conhecimento. Eis o texto que fez levantar a plateia, embora confesse, que tenha sido a meu pedido. Parabéns Pavilhão do Conhecimento! Viva Viva Viva!

Aqui vai a prosa:

Antes de tudo deixem-me dizer que nunca imaginei que um dia pudesse abrir um encontro em que se festejassem os 15 anos do que quer que seja. Neste em particular, em que se celebram os 15 anos de existência do Pavilhão do Conhecimento, sinto que devo falar daquilo que para mim significa a ciência. E a ciência significa para mim o futuro. E porquê, porque a ciência está sempre a falar do futuro. E a prova disso é que a palavra descobrir é uma figura sempre presente. Ciência é descobrir. Não quer dizer que a ciência não ligue ao passado – liga pois – mas está sempre a piscar o olho ao futuro. Eu não sou uma pessoa saudosista – não sou - olho e orgulho-me do meu passado e dos outros, mas estou sempre em bicos de pés para ver o que aí vem. Sou um futurista e a ciência parece-me que é um domínio onde está sempre tudo em aberto, inclusivamente o passado. Só a ciência, pode interferir no passado e fazer dele futuro também. 

No meu tempo, lembro-me que quando havia qualquer inquérito com crianças em que se perguntava a cada uma delas e que cada uma queria ser, muitas havia que diziam que queriam ser astronautas. Eu fui uma criança que também quis ser astronauta até ao dia em que percebi que viver na lua devia ser uma chatice. Aliás, quando ainda hoje ouço falar sobre as expedições a Marte e possibilidade de ali levarem pessoas que se disponibilizam a ficar uma vida inteira naquele planeta, pergunto-me: a fazer o quê? O que é que se pode fazer em Marte, o que haverá para descobrir? Marte não será como aquelas terras que visitamos e que nos parecem muito sossegadas e por isso muito românticas e boas para viver, mas que depois do terceiro dia, são absolutamente entediantes. 

Se querem a resposta - por mais que choque à comunidade que aqui está presente - eu acho que deve ser um tédio. E por isso, quando perguntamos agora às crianças o que querem ser quando forem grandes, são já poucas as que dizem que querem ser astronautas, quando muito, neste domínio, as crianças querem ser cientistas sim, mas para salvar vidas terrenas, para descobrirem curas para doenças, para salvarem o tio, o avô, para resolverem problemas mundanos que interferem com a vida de todos. Há de resto, um teste conhecido a nível internacional, que nos diz que a melhor prova de confiança que poderá existir, é comprar um carro em segunda mão a alguém. Se fizermos um exercício, são poucas as actividades profissionais – e nem sequer vou meter aqui a política e os políticos em que as pessoas, sem pestanejar, lhes comprariam um carro em segunda mão. E aqui, se me permitem, não tenho dúvidas que a grande maioria da sociedade actual, compraria um carro em segunda mão a um cientista. Um carro de um cientista, deve ter seguramente a revisão em dia, o papel do seguro devidamente actualizado, o carro limpinho e com sorte, se for um cientista dos bons, é bem possível que tenha um dispositivo qualquer que permita que o bólide voe ou melhor ainda, que consiga tirar cafés.

Ser cientista é hoje ainda e espero que venha ser durante muitos anos – uma actividade de grande mérito e indisfarçável idoneidade. Reparem só: quando há um anúncio de um desodorizante em que uma mulher de belas curvas, abandona um homem de insuspeitável figura para correr para os braços de um astronauta em plena praia, eu compreendo o que vai naquela garota. Aquela miúda, quer como todas as outras mulheres, que aquele homem a leve à lua, sem que contudo, deixe a terra. 

A ciência está por isso de parabéns, o pavilhão do conhecimento ainda mais, porque nesta zona da expo que chegou a ser referida como o novo Mónaco, as novas ilhas Fiji, o pavilhão do conhecimento significa ainda hoje o condado dos monarcas Alberto e carolina. E se dúvidas tivessem, olhem ao vosso redor e percebam como continua – 15 anos depois – impecavelmente limpo e com cheiro a novo. Se isto é um pavilhão que é frequentado por milhares de pessoas ligadas à ciência e está assim, imaginem como será o carro de cada um deles. Eu se me pedissem para comprar o pavilhão do conhecimento em segunda mão, juro aqui, perante todos, que o compraria convencido que estava a fazer um bom negócio. Reparem no chão que pisam, está ou não impecavelmente limpo? Reparem nas cadeiras onde estão sentados, tem ou não um cheque por debaixo do acento? Bem, por acaso não tem, mas podia ter. E seria um cheque para compra de produtos de limpeza para isto continuar assim.

Não sou cientista, não sou filósofo, não sou economista, não sou geógrafo, sou um simples cidadão comum que gosta de ciência e que tem por este pavilhão do conhecimento uma afeição fora do comum. Primeiro, porque as pessoas que aqui trabalham são fixes. Depois, porque estas mesmas pessoas desde cedo perceberam que a melhor forma de levar a ciência a todos, é adoptarem uma linguagem de proximidade em vez do distanciamento do costume e que tantas vezes verificamos em meios similares. Só assim se percebe que uma das suas áreas mais aplaudidas seja justamente baptizada de “ doing”. E que possivelmente a exposição com maior numero de visitantes se tivesse denominado “ knojo”, onde se falava de vómitos, de ranho e de puns.

O Pavilhão do Conhecimento faz 15 anos, há 15 anos eu chegava a Lisboa vindo do Porto e lembro-me bem que na última noite da expo onde todos decidiram também vir, eu perdi a minha namorada no meio da multidão por mais de 3 horas. Hoje, com os amigos que tenho no Pavilhão do Conhecimento, jamais teria cometido a insensatez de ter combinado com ela encontrar-me nas imediações da estátua do Gil, mas obviamente, à porta deste pavilhão. O que importa recordar agora, é que 15 anos depois, a minha namorada já não é essa – na verdade actualmente nem sequer tenho – mas, 15 anos depois, o pavilhão do conhecimento contínua igual, aqui e tão novo, tão fresco e tão limpo, como o conheci no primeiro dia.

Fernando Alvim

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