Tuesday, February 12, 2013

Os meus grandes problemas


O grande problema da minha vida não é a minha vida em si mas justamente a vida que perco à procura de coisas. Não há outra forma de o dizer, as coisas fogem-me.

E acreditem que não há aqui qualquer lado romântico no que agora escrevo, podia até ser uma metáfora de trazer por casa mas não, as coisas fogem-me mesmo, a tal ponto que ainda na passada semana fui buscar o meu candeeiro de quarto à rotunda do Areeiro. E o curioso é que não é a primeira vez que me acontece, já dei por mim de robe e pantufas atrás do meu frigorífico em Setúbal, das minhas calças no Sabugal, da minha carteira pertíssimo de Peniche e de uma novíssima máquina de lavar roupa que me fugiu para Aljustrel. E não sei o que lhes faça, repreendo-as, digo-lhes em tom irado “ não faças mais isto, olha que te troco de uma vez por todas” mas nenhuma delas parece importar-se. E entre as reincidentes, há três que me dão cabo da vida e me a tiram, literalmente. Se querem a verdade – e não vejo porque não a queiram – já terei perdido mais de dois anos à procura das chaves de casa. Um ano e meio em busca dos telemóveis, um ano à procura das calças e igual período à procura de uma esferográfica que ainda agora aqui estava. De resto, no exacto momento em que escrevo esta crónica, acabo de perceber que perante a minha notória concentração, o meu aspirador acaba de se escapulir pela janela.

Fernando Alvim
Publicado originalmente no jornal i
[Fotografia de Stanislav Stankovskiy]

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