Friday, December 14, 2012

Blogue Memória III


Hoje é sexta-feira e dia de Blogue Memória, que é como quem diz, dia de mais uma ida à cave obscura deste blogue para trazer à luz do dia um texto antigo. O de hoje, foi publicado numa quinta-feira de Setembro de 2007. Antes da Crise, portanto.

O casamento


De cada vez que vou a um casamento apetece-me casar, peço desculpa por este desabafo, mas é a realidade e não há nada a fazer. Por mais que custe – e custa - Casar é uma coisa bonita – eu choro muito – e é sempre uma oportunidade única para reencontrarmos velhos amigos e não raras vezes distintas senhoras com laca no cabelo.

As mesmas senhoras que ao verem-nos com alguém nos questionam com pertinência “Então e vocês, quando é que se juntam?”, “Estão a ver como é bonito, para quando um netinho para a senhora sua mãe?” – Antes de continuar: Deixem-me dizer que adoro a expressão senhora sua mãe. Depois, confessar que a utilizei neste texto abusivamente visto que, infelizmente, nunca trataram a minha progenitora com tamanho epíteto, peço por isso desculpa. Onde é que íamos? Ora, exactamente. Há uma pressão nos casamentos e não é só na máquina das imperiais, é nas famílias que aqui reunidas, nos mostram que embora não se encontrassem há mais de 15 Natais aqui estão juntas e ainda se lembram praticamente dos nomes uns dos outros. Há uma pressão sim, quando nos encontramos com um amigo, com um filho ao colo e a mulher a ver as montras e, nos questionamos em silêncio: Deve ser bom ter um filho assim, não é? Que raio de montra está ela a ver?

No casamento dos meus amigos faço sempre questão de ler na cerimónia. Faço-o, porque sei bem que esta é uma oportunidade única de falar para as pessoas sem que estas possam abandonar facilmente o local e porque, com mil raios, porque gosto de ouvir a minha voz na esplendorosa acústica da Igreja. Para que conste - e escreva-se em acta – na última cerimónia em que participei, ao contrário do que é habitual li não uma, mas duas passagens da bíblia com tamanha distinção, que há já quem me vaticine uma digressão nacional por todo o território. Esta semana na Sé de Braga, amanhã na Igreja do Bonfim, para a semana quem sabe, em pleno Vaticano, sendo certo que há uma coisa que não poderei voltar a esquecer-me: De dizer “Palavra do Senhor” no final de cada oratória. Ámen.

As coisas mudaram. Actualmente, já ninguém faz casamentos em Restaurantes e mesmo as Quintas já tiveram melhores dias porque o que realmente está a dar – não se fala de outra coisa em Nova Iorque – são as herdades. É impressão minha ou dá muito mais estilo anunciar que nos iremos casar numa herdade do que propriamente numa quinta. Experimentem dizer algo como: Vou casar-me na Herdade de Santo António! E agora tentem anunciar isto: Vou casar-me na Quinta de Santo António! Confessem, é indesmentível. A herdade transporta-nos para um cenário de sopa de gengibre e lagostins enquanto a Quinta remete-nos para carne de porco à alentejana e baba de camelo. A herdade soa com coisa herdada e família com Brasão, a Quinta com aluguer à hora e casamento com separação de bens. Numa ou noutra que sejam felizes, que os noivos se beijem e digam “SIM!” alto na Igreja, que a noiva chore e mãe do noivo desmaie, que se embriaguem os padrinhos, que digam SIM alto na igreja, que a noite de núpcias seja como na primeira vez, que o senhor padre seja simpático como na primeira vez, que os noivos digam SIM! Alto na igreja.

[Fotografia de Tina Aumont]

No comments:

Post a Comment