Monday, January 05, 2009

O que é que está a dar?




De cada vez que saio à noite, há imensa gente que me pergunta: O que é que está a dar? E normalmente, quando o fazem eu tento reproduzir o que me dizem as pessoas que sabem o que é que está a dar. Eu desconfio sempre de coisas que estão a dar desde que vi um senhor munido de um microfone ao peito : era como se fosse uma harmónica igualzinha à do Bob Dylan mas o senhor era mais entroncado e não cantava o "Like a rolling stone". O senhor dava. Dava canetas e ia dizendo " chegue-se aqui, aqui não se paga nada, se não acredita, venha e comprove com os seus próprios olhos". E os meus olhos comprovavam o que dizia. O senhor dava canetas de borla, o senhor dava relógios e quando já muitos pensavam que o senhor estaria a cumprir uma estranha promessa onde não poderia receber dinheiro de ninguém, o senhor, este senhor de microfone ao peito, beneficiando do entusiasmo dos que o rodeavam convencidos de que aquilo que iria licitar a seguir também iria oferecer, vendia para espanto de todos – agora sim – vendia por bom preço, um que não valeria nem metade desse valor.


Daí que desconfie de coisas que estão a dar. As coisas que estão a dar são como as caixas Multibanco, aparentemente estão a dar-nos dinheiro, mas na realidade estão a tirar. Mas isto não quer dizer que eu não vá aos sítios que estão a dar. É óbvio que vou, mas quando o faço, tenho a mesmo atitude de alguém que vai no metro em hora de ponta: tenho atenção à carteira.




É muito raro que os sítios que estão a dar não se aproveitem indecentemente disso e aqui para nós, eu acho que fazem bem. E explico porquê. Porque os sítios que estão a dar, foram eleitos democraticamente. Isto é, existem outros locais. E se as pessoas pagam 5 euros por uma água de luso, é porque querem e porque sabem que não estão só a pagar uma água de luso, mas também a vista que é tão bonita e aquela loira que há tanto não víamos. É claro que é um abuso? – É sim senhor – É claro que é um roubo? – É sim senhor, agarra que é ladrão! - mas é o preço a pagar para estar num sitio que está a dar. Agora, quando existe uma situação de monopólio, a minha opinião é diferente. E obviamente falo das estações de serviço, dos preços praticados nos aeroportos, nos hotéis e nos comboios por exemplo. Isto é, vou à estação de serviço da Mealhada e como bom cidadão português que sou, deito a mão a umas enternecedoras sandes de leitão e quando vou a pagar: são 6 euros e verde código verde se faz favor. Pois bem e aqui o que é que eu faço? Vou à mercearia do lado que será mais em conta? Ou verde código verde? Pois não me resta outra possibilidade do que marcar os algarismos, que são obviamente a minha data de nascimento. E com um café a 1 euro no bar do comboio também? A não ser que salte fora em andamento sim. E 3 euros por 15 minutos de Internet num hotel igualmente? A não ser que vá de táxi ao centro da cidade às 3 da manhã onde possivelmente o cibercafé já estará fechado, sim. E um cházinho de menta a 2 euros e meio no café do aeroporto já na zona posterior ao ckeck in? Pois não é coisa que se escape, porque ninguém quer descalçar-se outra vez que o chão está frio. Isto sim, revolta-me e faz-me salivar da boca. Agora, os sítios que estão dar? Esses, vou precisamente enquanto estão a dar. E há muita gente à porta e raparigas muito perfumadas e um porteiro muito concentrado a dizer que aquele senhor pode entrar mas aquele outro já não poderá entrar. Com pessoas muito bem vestidas, com música na batida certa, com todos os ecrãs ligados na fashion tv, com toda a gente a fazer o que deveriam reservar para uma instituição humanitária: a dar. Eles sim.

7 comments:

  1. Muito bem escrito, e não podia concordar mais =)

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  2. Concordo absolutamente com o que foi enunciado.

    Só uma duvida: porque razão não existe o podcast do Bruno Aleixo e dos Contemporâneos aquando a passagem pela Prova Oral?

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  3. O que não está a dar, é a Speaky.tv... Não acrescentas nada acerca deste assunto? Sinto alguma curisosidade. Vá lá...

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  4. Excepcionalmente bem pensado misturado com graça. Como é que o consegues? "Chiba-te" da fórmula.

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  5. o que andas a pôr no narguilé?

    gostei muito. puras verdades.

    ainda há tempos li também aqui uma outra reflexão tua.

    gosto da forma como escreves coisas sérias, sempre com um pouco de comicidade à mistura.

    é assim que temos de encarar a vida: de forma séria, mas com muito humor à mistura.

    c.c.

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  6. Eles deviam reservar o dinheiro para uma causa humanitária mas tu ainda bem que não reservas estas reflexões só para ti.
    És uma autêntica máquina de disparar bolas de ténis. Sempre em cheio. Um abraço

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  7. Está a dar sim senhor... Boa malha, mais uma...

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