Wednesday, February 09, 2011

Malditas Expectativas


Seria perfeito que tudo o que fizéssemos tivesse valor, mas o grande problema é que nem sempre o valor ou a falta dele nos é anunciado. Isto é, por vezes até é de facto anunciado, mas depois revela-se exactamente ao contrário. Já ninguém acredita nos críticos de cinema, nem de música, nem de culinária, nem os do costume. Ninguém no seu perfeito juízo deixa de ir ver um filme porque teve uma única estrela no público ou bola preta no Expresso. Quando muito, o que pode acontecer é irmos ver o filme ao cinema com uma outra expectativa. E se formos com pouca, a possibilidade de sermos surpreendidos e darmos valor ao que acabamos de ver, é infinitamente superior a chegarmos ao local com expectativas muito elevadas.

Aconteceu-me isto com alguns filmes, com algumas pessoas, com alguns momentos que julguei irem ser inesquecíveis para depois se revelarem vulgares e populachos. Mas ainda assim gosto de ter expectativas, embora as minhas preferidas sejam as quase inexistentes ou nenhumas. De tal modo, que deixei de alimentar expectativas. Limito-me a tê-las e pouco mais. E quando me perguntam se as atingi, digo que sim: com dois tiros.

Mas isto é a vida e não há nada a fazer. Eu também gostava muito que tudo o que fizesse fosse muito especial e cheio de valor, mas normalmente temos tendência a acharmos que por ser nosso, é mais especial, tem mais valor que o de outros. E isto não tem que ser necessariamente umbiguismo ou egocentrismo. O problema é que mesmo conscientes disso e por mais que não o queiramos, é sobre a perspectiva do nosso eu que sempre nos vemos. E o problema é que é um “eu” de dentro, porque não há um “eu” de fora. Por mais que nos digam como nos vêem de fora, será sempre a imagem com a qual nos vemos por dentro que acreditamos mais. E isso pode também determinar o nosso valor. Ou a falta dele. Ou a forma como o vemos.


Fotografia de Dan Anderson

6 comments:

  1. Olá Alvim,

    :) Muito bom tema pra se discutir.

    No que toca às EXPECTACTIVAS eu gosto de me agarrar a esta idéia:
    - Se vais com elas tudo é prejuízo, se não vais com expectativas tudo é lucro.

    Sou da mesma tribo, expectativas é melhor mantê-las no mínimo. ;)

    Beijinho,
    --
    Sandra Semblano

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  2. Após leitura desta pequena reflexão que, à primeira vista, parecia abrir portas a uma teoria fundada sobre as expectativas e a falta delas, deparo-me com a teoria de que "não há um «eu» de fora". Parei, pensei e... permita-me dizer-lhe que não faz sentido absolutamente nenhum não só, mas também, por se tratar de uma teoria absolutamente egocêntrica (ou umbiguista, vá!). Há sempre um "eu" de fora, porque temos a perfeita noção, na maior parte das vezes, do impacto que causámos, daquilo que os outros pensam e sabemos (por vezes demasiadamente bem) como nos vêem. E chegamos mesmo a sair do nosso "eu" de dentro para vermos o "eu" de fora. Há momentos em que gostamos do que vemos e outros que nem por isso.
    Além do mais temos sempre expectativas, não existem isso das expectativas "inexistentes", aliás, são elas que nos movem, mesmo que depois se revelem em totais fracassos para que possamos dizer «Eu bem sabia!»

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  3. Alvim,
    O que fazes, do que conheço, é incansavel e de enorme qualidade!
    Mas a realidade é uma só - só valemos alguma coisa enquanto precisam de nós...quando não precisam é um xuto no rabiosque e siga para a frente que atrás vem gente.

    Um abroço*

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  4. Parabéns pelo blog, os teus textos são sempre interessantes.

    Morte às expectativas, tudo corre melhor se não as tivermos :)!!

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  5. aconteceu-me exactamente isso ontem quando acabei de ler um livro que estava com uma expectativa enorme. não era mal, de facto, mas não chegou a ser aquilo que eu esperava.

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  6. Um, Ninguém e Cem Mil, texto que exerceu fascínio sobre mim, por retratar o que o meu eu muitas vezes sente.
    O seu eu deixou o meu eu inquieto com vontade querer conhecer mais o seu.

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