Vou já dizendo para arrepiar caminho, que não tenho medo nenhum de morrer. Vamos cá ver: ter até tenho, porque morrer significa um apagar de luz que não estou preparado – nem nunca estarei, aqui vos digo –, mas o que eu tenho mesmo, é medo de fazer sofrer enquanto morro. Quando morremos há muitas pessoas que morrem connosco e é a pensar nelas que não quero. Não quero que pessoas que tanto gosto morram comigo por saberem que morri. Daí que quando me dizem "olha que a continuares assim, vais morrer sozinho!", eu invariavelmente suspiro como se fosse um sonho bom. E porquê? Porque não quero que na altura de morrer, ninguém esteja comigo.
Pelo contrário, faço questão que quando o pressentir tenha fôlego suficiente para dizer a quem está próximo "Olha, parece que estão ali a chamar-vos lá fora, se não se importam deixem-me agora um pouco sozinho que eu quero aqui fazer uma coisa que não podem ver!" e posto isto, aproveitando a ausência que sei ir ser curta, morro ali num instantinho. Assim, de repente. Sem sofrer nada e sem fazer sofrer. Como se saíssemos de manhã para comprar cigarros e não voltássemos. Ficávamos a meio do caminho entregues a um momento que deve ser nosso, apenas e só, nosso. Mas não é. E cada vez mais percebo que todos querem estar presentes na hora da nossa morte quando muitos deles o deveriam ter feito em vida. Dispenso pois os aplausos que saberei não ouvir – aplaudam-me agora – dispenso pois flores – dêem-me agora – poupem-me os elogios "Que era bom rapazinho! Que deixará saudades! – falem-me agora enquanto vos ouço pois quando estiver reduzido a cinzas não ouvirei patavina do que me dizem. Mas não. Pelo contrário, quando estamos a morrer – e eu espero estar muito longe disso – é usual dizerem "Ele está a morrer, não posso o deixar sozinho" -, quando afinal – para mim por exemplo – é tudo o que quero.
Por mais que nos custe, nos funerais as pessoas falam umas para as outras e não para quem morre, tal qual muitas mulheres se vestem umas para as outras e não para os homens. A morrer – e esse dia virá por mais que me custe – gostaria apenas de pedir um último desejo. O de estar vivo, apenas e só, para assistir à minha morte. Que mórbido, dirão! Pois que o seja, ora essa, mas quando vamos morrer somos pequeninos de novo e tal qual o aniversário de uma criança muito pequena tudo nos deverá ser permitido. E assim – pensando bem – é legitimo o que peço. Viver apenas o tempo suficiente para assistir à minha morte. O tempo suficiente para perceber quem me chora com igual intensidade à que eu chorei quando o Veloso falhou o penalty frente ao PSV Eindhoven. Só peço isto – respeitem-me pois- perceber quem ali foi e que eu já não via tanto tempo só para comentar em tom baixo "ainda ontem liguei àquele sacana para irmos para os copos para o Bairro e disse-me que estava cheio de trabalho e agora é isto, olha para ele ali como se não tivesse nada para fazer!" Quando morre alguém, de repente, as pessoas ficam sem nada para fazer. Daí que não vá a funerais ou que os evite a todo o custo porque quero chorar e rir com quem é vivo, fazer-lhe uma última homenagem todos os dias como se fosse o primeiro e não o último. Bater-lhe palmas em vida, dizer "És o maior! Gosto de conversar contigo pá!" na certeza de que a pessoa ouvirá o que lhe digo. De lhe telefonar a dizer "era só para saber se estavas bem, pois não tenho novidade alguma" de lhe escrever ou enviar uma mensagem revelando que a festa está boa "Mas que não é a mesma sem ti". Depois de morrer – e esse dia virá pois então – só ouvirei palavras e sentirei os gestos que me tenham sido dirigidos ainda em vida. A tudo o resto – só por perrice - faço questão de fazer ouvidos moucos.
Tens razão. Tens razão em tudo isto que escreveste. Concordo em pleno. O raio do penalty também me fez chorar baba e ranho...
ReplyDeleteSaí de casa em tempo negro………. vou partir ao encontro de sossêgo, ando, caminho lentamente como se o tempo parasse por um momento sobre pedras que se mexem sob o meu andar, olho em frente na esperança de te ver andando para cá para me abraçar, mas so o caminho escuro sombrio eu encontro como se fosse gelo e frio…ali na solidão do ser sobre a imensidão do luar….por momentos ao longe ouço o mar, aquele barulho que enche almas arrasta tristezas e que me abana e que me mexe! E sigo pela areia e sento me na pedra fria olho o mar como para o espelho….não se ouve nada… olho a volta não vejo ninguém…..estou sozinha, sou so eu……… o mar…………. a lua…………. e o frio, sinto a presença dos que me fazem falta e o olhar das estrelas sobre mim….de repente grito como se fosse estrear a voz…tão alto…. tão profundo que todas as minhas forças por momentos se vão, e o coração não bate, as ondas, ouço as mais alto sobressaltadas… furiosas…. zangadas….o vento abana me com raiva e as nuvens cobrem o luar! Estava escuro nem o negro se definia e tive a certeza….. do sinal de que existe alguém que esteve e está sempre comigo, continua aqui mas não vejo, só isso, e que me encontrou, e que me gritou, abanou, sacudiu, agitou tão poderosamente que me tirou e …………foi isso!!! tirou e encheu minha alma outra vez……e aí nesse preciso momento soltei um alivio em forma de gargalhada o vento soprou e fez me levantar, o luar aumentou e iluminou o caminho para eu passar….. o mar acalmou…e eu….levantei me andei e à beira do mar abracei Aquele que me fez caminhar e sigo para viver e sigo para amar sigo para provar que vale….simplesmente muito a pena…..ficar!
ReplyDeleteMãe quando eu for grande quero ser como tu, consciente da vida, mas mãe eu quando morrer quero ser como o primo, é que sabes ele tá sempre sempre comigo e eu gosto ainda mais dele!
Bolas... Caramba... Nem sei o q te dizer!
ReplyDeleteVê lá se me ligas pá e vamos jantar!
Beijo,
Sara (Chapitô..)
Não podia estar mais de acordo com este texto. Além disso também não gosto nada de funerais e o último a que fui foi a experiência mais penosa a que tive que assistir até hoje na minha vida com a viúva a atirar-se para cima do caixão e a não se largar nem por nada.
ReplyDeleteparabens pelo texto! mt bom..concordo inteiramente!
ReplyDeleteThere'll be two dates on your tombstone and everyone will read them... However, the only thing that trully matters is the little dash between them! ;)
ReplyDeleteAdoro 'ler-te'... :D
Beijo*
Muito bom mesmo. O conceito e as palavras..
ReplyDeleteNão tenho medo de morrer...só tenho medo de morrer depois de todos aqueles que dão sentido à minha vida...
ReplyDeleteSomos terrivelmente egoístas perante a morte de outrem - choramos "o coita-dinho" elevando-o a Santo não por aquilo que este é/foi... mas pelo efeito da ausência do mesmo na nossa vida.
ReplyDeleteSo live and let live...
Belíssimo texto, este.
Alvim: és um porreiro!
Conheces o Ken Lee?
http://blogadinhadosvirtuais.blogs.sapo.pt/25642.html
Parece ironia, mas era mesmo este link que eu vinha partilhar...
Enfim, felicidades...?
Muita bem alvim.. tenho tanto medo como tu, e tal como tu, prefiro aproveitar tudo o que referis-te, enquanto ca tou!abraço..
ReplyDeleteesse penalty do veloso..
À falta de melhor, o Le temp qui rest do Fançois Ozon é capaz de ser um bom filme para acompanhar esse estado de espírito...
ReplyDelete(P.S.: fui a única a ficar surpreendida por neste país se terem finalmente começado a fazer homenagens aos vivos? É tão incomum que chega a ser mórbido ahaha)
Alvim,gostei VERDADEIRAMENTE deste teu post!Muito bom,muito sentido tambem..e diz muita coisa que é verdade!!Tens toda a razao em tudo o que escreves nest post,principalmente na ultima parte do post!Eu tento seguir sempre o lema "carpe diem" á risca, pois acho que devemos viver cada dia como se fosse o ultimo, e aproveitarmos todos os momentos na nossa vida, aproveitarmos os amigos que temos, que podem ser poucos mas bons como se costuma dizer!!
ReplyDeleteUm grande abraco alvim!
Ja agora aproveito para te perguntar quando te vou poder ouvir por um som?Quando vens a linha de Cascais?!
És o maior!
ReplyDeleteJantamos?
brutal, o texto...
ReplyDeleteaté me arrepiei! podias ter escrito este texto em qualquer dia do mês (um mês tem cerca de 30 dias) e foste logo escolher quarta-feira, dia 26 de março!!!
ReplyDeletea minha irmã faleceu ontem de manhã. tinha planeado ir visitá-la novamente. mas ao que parece não quis esperar.
tens razão no que dizes, as pessoas, na hora da morte, querem acima de tudo estar sós. sabem que as partidas custam sempre muito para quem fica.
e como dizes e bem, é quando as pessoas estão vivas que devemos mostrar o nosso amor por elas.
amanhã vou ao funeral da minha irmã. vai-me custar, mas tenho de o fazer.
bjiinhos ;)
Parabéns pelo texto!
e desculpa o desabafo. foi um pouco deprimente, eu sei!
Se toda a gente pensasse assim...
ReplyDeleteHaveria muitos mais sorrisos, pois as "palavras bonitas" chegavam aos nossos ouvidos a toda a hora e os nossos olhos brilhavam como brilha o SOLLLLLLLLL, mesmo que atrás das nuvens!!!
"Uma vela não ilumina menos por passar luz para uma outra vela..."
És o máximo!
ReplyDeletenao podia concordar mais com tudo o que fo escrito... simplesmente genial... adorei =)
ReplyDeleteAlvim, Alvim...tu agora é que quase me fizeste chorar....qual Veloso, qual quê!!!Se bem que foi realmente trágico esse episódio....
ReplyDeleteEste teu texto deixou-me sem palavras!! É de uma intensidade hipnotizante e atordoante, mas simultaneamente, e primordialmente,...MÁGICO....
Aproveito para te dizer enquanto me consegues ler, "e ouvir", que gosto de ti...que gosto, também, de saber que estás bem....e por último, que esta festa, que é a vida, está boa, mas sem ti, perde alguma piada...
Fazes-me rir...gosto de "conversar" contigo....
*
Inês
A morte é um tema mt complicado de falar , na minha opinião o mais importante é não sofrer , uma vez disseram me que qd nascemos a coisa + certa que temos na vida é morrer quando e como nós não sabemos .É uma gd verdade por isso acho que é importante viver cada dia como o último pk amanhã podemos n estar cá, e tentar mos ser feliz cada dia isso tb é importante .Para mim o pior na morte é o sofrimento , mas enfim é a vida e nós n sabemos o que esta reservado o importante é ser feliz . Sê feliz , bom fim de se mana beijos doces:)
ReplyDeleteamanha às 21h, 1hora sem energia electrica. toca a aderir ;)
ReplyDeletewww.earthhour.org
É ... de facro está um optimo texto. E é de louvar que seja escrito pelo Alvim. quando acabei de ler até parecia que estava a ler o testamento da tua morte 8sem ofensa). mas caramba ... conversas deprimentes já chega as que temos por causa do país. vamos sorrir, vamos cantar vamos dançar. e se enrtetanto eu tiver de morrer ... que morra. e eu nao peço para viver nem peço "só mais uns minutinhos". Se tiver mesmo de morrer que seja rápido e há dois clichés que estão associados a este sentir. primeiro "toda a gente vai ter de morrer mais cedo ou mais tarde" o que é uma verdade incontestável numa primeira análise. o outro e uma frase que se ouve em imensos filmes "podes fazer o que quiseres comigo mas deixa a minha familia e os meus amigos fora disto" que nao passa de uma conclusão do texto do Alvim. Alvim ... és grande e tas cá dentro.
ReplyDeleteassinado
djpipoca
Bem Visto!!!
ReplyDeleteQue coincidência !!
ReplyDeleteO fim de semana passado estive num velório ... e passou-me isso tudo pela minha cabecita. Assistir ao nosso próprio funeral para ver como é ... aliás já imaginei e .... é como dizes , digam essas coisas todas agora que estou viva caneco ...depois quero lá saber !!!!!!
Sandra de Penix
dos melhores textos que ja li..mesmo!
ReplyDeletePalavras para quê?!?!? Acho que disseste tudo (o essencial). Agora digo-te eu antes que um dos dois morra, porque aí já não valerá a pena e agora ainda vou a tempo: O teu Benfica pode nao estar em grande forma, mas tu Alvim a escreveres o que te vai pelo coração, desta maneira, enches a alma de quem te lê.
ReplyDeleteMuito muito bom!! Não é um texto de 'morrer' a rir, porque o tema é minimamente sério...mas depois de lido o texto, parece que que o próprio tema da morte fica super banal...o que é bom!!
ReplyDeleteAh, sei que não vem agora ao caso, mas eu digo SALSICHA!! (ok, secalhar quem diz salchicha tambem escreve 'salsicha', mas eu digo mesmo salsicha)!
O medo que temos de morrer tem exactamente a mesma causa do medo que temos que os que nos são mais queridos morram. É o medo de perder algo que nos faz muita falta. Aquela conversa, aquele riso, aquela confidência… tudo aquilo que nos liga.
ReplyDeleteConcordo contigo quando dizes que devemos ligar só para dizer olá, sem motivo, mas enquanto ainda temos tempo…
Muito bom este post! (mas qual é a admiração!)
Garfield
Quero estar por 'cá' o máximo de tempo para poder mostrar a todos os que adoro, que me são importantes todos os instantes. Não quero partir desiludida com ninguém, nem quero deixar ninguém a pensar que devia ter falado comigo, mas que agora é tarde demais.
ReplyDeleteQuanto ao penalty falhado, não chorei. Mas é mesmo assim, gostos não se discutem. ;P
Espero sinceramente que o dia em que 'nos' abandonará, esteja muito, mas muito longe para chegar.
Tenho muito gosto em ouvi-lo (na rádio) e lê-lo (por aqui).
Muy Bueno!!!
ReplyDeleteHasta!!!