Thursday, February 14, 2008

É meu!







De entre todos os sentimentos que existem, o pior de todos é – e peço já desculpa aos outros – o sentimento de posse. As pessoas gostam de ter, de dizer que é meu e de preferência pagarem a pronto. Portugal não gosta de alugar. Se tiver dinheiro, o português compra, mesmo que para isso tenha que fazer mais um esforço para pagar um empréstimo a 30 anos e no fim dizer que: "É meu!". Recebe-se alguém em casa, vai-se mostrando as divisões e a primeira pergunta que nos fazem é: "Mas isto é teu?" E com a tristeza de um pescador que vem do mar sem nada na rede, encolhemos os ombros e dizemos: "Antes fosse, mas não. É alugada!".




Os portugueses gostam de dizer "É meu!" e quem alugar ou comprar a leasing - um carro por exemplo - é olhado com desconfiança e até, deixem cá ver, menosprezo. A vizinha do lado comenta com a outra no parapeito da varanda: "Já viu o carro novo do vizinho da frente que chegou esta semana? e mesmo que não o saiba, esta, de forma viperina vai dizendo: "Pois, pois, deve ter sido comprado a leasing. E assim também eu!" Como se a leasing fosse batota.
De resto, ao mínimo sinal de rápida ascensão financeira, é incontornável que o empresário que teve sorte com o negócio que criou e que à custa disso já comprou uma vivenda e mudou de carro duas vezes este ano, está - pois com certeza! - "Está mas é metido na droga!". A casa dele tem piscina! - Isso é droga! – Comprou agora um barco! – Droga é o que é! – Foi de férias com a família para os Alpes! – Não tenha dúvidas que é droga!




Por isso, se isto neste plano é assim, imaginem quando o sentimento de posse se alastra ao foro sentimental. É pior ainda. Com uma vantagem. Se rapidamente conquistarmos alguém ou dermos mostras de que temos cada vez mais casos bem-sucedidos "aquele ali anda sempre com mulheres bonitas!" serão poucos aqueles que dirão, que "andamos metidos na droga". E isso é bom. Se bem que para mim, se eu andasse metido com a Charlize Theron, bem que me podiam chamar o " Pablo Escobar de Campolide" que eu não me importaria. Mas adiante.




O sentimento de posse manifesta-se quando acabamos uma relação – reparem que fomos até nós que o fizemos – e passado uns tempos, quando a vemos com outro, não sei porquê, mas ficamos com um formigueiro nos pés que deus me livre. Na verdade, aqui entre nós – e agora baixe o jornal que esse senhor do lado está a ler isto – o que nos agradaria, era ver aquela palerma que nós deixámos – nós, ouviram bem? - aos rebolões pela rua, moribunda, chorando pelos cantos a clamar o nosso regresso. E o que é que acontece? Exactamente o contrário. Está tão melhor do que nunca que até parece que lhe demos saúde. E demos. E assim, quando alguém nos diz :" olha, ontem encontrei a tua ex-namorada ás compras no chiado?, à nossa imediata pergunta de " Como é que ela está?" nada melhor do que nos responderem:" Tão diferente que não imaginas. Mais gordita, mal tratada, uma sombra daquilo que era no teu tempo! E por mais que nos custe reconhecer – e custa - ficamos contentes ao ouvir isto como se disséssemos "Safei-me de um bom estafermo!". O sentimento de posse é isto. É mau. Mete vergonha. Devia ser banido, mas existe. Mas ao contrário do que acontecia até aqui – e isto é pior ainda - poucos são aqueles que ao saberem-no, dizem : "É meu!"

9 comments:

  1. Cada vez menos, temos alguma coisa que possamos dizer:"é minha"!
    A vida é tão rápida e dá tantas voltas, que não vale a pena pensar muito nisto!
    Adorei o texto...como já vem sendo habitual;-)

    Bjo meu:-)

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  2. É horrível... É só isso que te digo... É horrível este sentimento de posse que assombra a sociedade portuguesa!

    Ter de ter para parecer!

    Será que a nossa mentalidade um dia irá mudar?
    Alugar é sinónimo de:
    “coitado, não pode”
    Comprar (a pronto) é sinónimo de:
    “negócios duvidosos, dinheiro sujo”.

    Quando o alugar pode ser opção, porque é normal para essa pessoa, porque quer!
    O comprar pode ser por sucesso profissional, por esforço e sacrifício!
    Nós não vivemos em função da nossa própria vida, mas sim contentes com a desgraça dos outros e com “dor de cotovelo” com o sucesso dos mesmos, é cá uma ironia. A maldade está presente em cada um de nós nas formas mais fantásticas e absurdas, mas não, somos sempre bonzinhos... A vida dos outros é que nos incomoda, a vida dos outros é que nos obriga a falar dela, é tão fácil cair nessa banalidade de falar mal de alguém. E fica-nos tão mal!

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  3. O sentimento de posse no que respeita à nossa vida amorosa é tão primário como se alçássemos a pernita e fizéssemos a bela mijadela no território a marcar. E apesar de saber isso racionalmente, às vezes invade esse sentimento que muitas vezes mais não é que uma gritante insegurança. Daquelas que nem usando cintos bem apertados perdemos. eh eh eh.

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  4. Querido Alvim,
    Adorei. Estás cada vez melhor.
    Be my Valentine!!! - Foleiro, mas sentido!

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  5. Querido Alvim
    Afinal não quero ser anónima.
    Beijinho grande
    Catarina

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  6. Esse sentimento de posse perante objectos e pessoas [lá fora] vem da falta de segurança emocial [cá dentro]. Mas eu não vejo mal nenhum dizer: " Esta é a minha família. Esta é a minha casa. Este é o meu curso. Este é o meu carro. Estes são os meus amigos. Este é o meu comunicador favorito. Esta é a minha planta de estimação. Esta é a minha cidade. Este é o meu país." A diferença é que este sentimento de posse leva como recheio uma quantidade infindável di amore!



    ps- Charlize Theron...?! [lol]
    Lamento Alvim.
    :)

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  7. Só pussuo os meus sonhos, e com eles deliro, para nunca viver, mas sempre aspirar a viver, sempre sonhar... tenho o delirio da posse dos sonhos! Um abraço

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  8. Alvim...
    embora pareça infantil, tenho de dizer: "Tu rulas nas horas!"

    O que te atormenta, Alvim?! ;)

    Eu disse que te ia acompanhar, não disse? ;)

    Beijo*
    Sílvia

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