Thursday, August 30, 2012

MORRER DE NOVO


Embora não o queiramos admitir todos nós temos um prazo de validade tal qual um iogurte da mimosa. E daí sermos rotulados desde o inicio que somos parecidos com aquele, que soamos de forma idêntica a alguém. Somos mais parecidos do que julgamos, embora todos tenhamos ideia contrária. Não são só os gatos que têm sete vidas, nós temos mais ainda e morremos mais do que uma vez. Só quem não vive é que não morre nenhuma. Morrer faz bem, porque quando nascemos de novo vimos mais fortes e com mais vida ainda.

Ter um prazo de validade tal qual um iogurte da mimosa pode não significar que morramos aí, mas sim que a partir dessa data tenhamos mais cuidado, como se o depósito do carro tivesse entrado na reserva. Quem já não comeu um produto fora do prazo de validade que levante um braço, dois até. Já o fizemos todos e continuamos todos vivos. Com a vida também é assim, é necessário muitas das vezes não cumprirmos a validade que nos impõem sob pena de nos resignarmos a essa fatalidade. À quantidade de conversantes com os quais nos alimentamos durante estes anos, é natural que estes façam justamente a sua função: que nos conservem. E talvez por isso eu só use produtos com conservantes, a mim não me apanham, nada de coisas naturais, nada de cenas biológicas, se puder comer esparguete com conservantes, juro-vos que como. E só isso explica que a esperança média de vida tenha vindo a aumentar exponencialmente nos últimos anos. Estamos mais conservados do que nunca e, na qualidade de conserva, com o nível de vida que temos agora, não tenho dúvida de que seremos de lata.

O prazo de validade é um pouco como o destino, finta-se se tivermos vontade de nascermos de novo. E tem que ser uma finta à Messi, uma revienga à Pelé, daquelas que deixam o adversário de olhos tortos a pedir Xuxa à mãezinha. Já dez vezes nasci e morri outras tantas, hoje já morri e nasci uma vez e acho que vou agora morrer de novo. No sofá, pela fresquinha.

Fernando Alvim
Publicado originalmente no jornal i

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