Anda toda a gente atrás de uma vida. E acho legítimo, porque há quem não a tenha. Desenganem-se aqueles que pensam que basta viver para ter uma vida. Assim era muito fácil, nascia-se e pronto, tinha-se uma vida. Mas não é assim tão simples. Ter uma vida é das coisas mais complicadas que eu conheço e eu nem sequer devia estar a escrever sobre isto - na verdade devia estar caladinho como um rato - porque basicamente não a tenho. As pessoas que têm uma vida, normalmente têm tempo para tudo e eu não tenho tempo para nada. É uma questão de organização, dizem-me, e eu talvez concorde, mas não há organização que me aguente. A vida tem que ser pensada com se fosse uma empresa, é mais isto. Tem que haver um plano - não tem que ser uma coisa metódica e rígida - mas tem que haver uma estratégia. Aqui o rapaz, que não a tem, faz o que pode em relação à sua e inventou um sistema de listas. É uma coisa muito bonita e viciosa que faz com que eu tenha listas para tudo.
A minha vida está marcada pelas listas que eu faço desde que me conheço. São listas de tarefas para a semana, de afazeres no dia de hoje, lista de problemas a resolver, lista de coisas para sair à noite, listas fixas, listas provisórias, listas de presentes, listas de prioridades, listas de planos, lista de ideias, lista de obrigações profissionais, lista telefónica, enfim, listas de tudo. A minha vida é às listas. Aliás, esta crónica estava incluída numa dessas listas, precisamente na lista de tarefas para a semana. Mas mesmo assim, como seria previsível, como é costume, passou para a lista de afazeres para hoje. Porquê? Porque não consigo ter um plano e obviamente não me serviu de nada pensar que iria fazer a coisa com calma, olhando paulatinamente pela janela, escrevendo e voltando atrás para ver se estava bonito e essas coisas todas. Não, nada disso. Acabo sempre a escrever no limite do prazo de entrega. E não me perguntei porquê, porque a verdade é que não sei funcionar de outro modo. E tenho pena. Mesmo com estas listas todas, há algo que me acontece que me faz chegar à pele, escrever à pele, viver à pele, como nos filmes do MacGyver, onde é sempre nos últimos segundos, na verdade no último segundo, à pele, que ele consegue com uma colher de iogurte e compota de morango, detonar uma bomba que destruiria um quarteirão inteiro. A minha vida e a de tantos outros, está sempre nesse último segundo, à espera de uma ajuda divina, de uma sorte, de uma inspiração súbita, de um herói como o MacGyver. A minha vida está sempre a ser salva no último segundo. E ou muito engano ou irá ser sempre assim.
Fernando Alvim
Fotografia de Matthew White
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