Friday, October 10, 2008

Uma crónica bué da linda!



Há palavras que caíram em desgraça tal qual pessoas caídas no sofá depois de um dia intenso de trabalho. Há palavras que estão exaustas e a palavra “jovem” é uma delas. De cada vez que ouço alguém a dizer “jovem” lembro-me, como todos, dos emblemáticos anúncios dos idos anos 80 que apelavam ao alistamento de todos numa carreira de sucesso, fosse ela na Marinha, na Força Aérea, nos Fuzileiros. Começavam sempre por uma pergunta que se fazia desde logo representar por esta palavra, e depois “Jovem, queres seguir um um futuro promissor?” e adivinhando que todos - tal como eu - abanávamos o queixo de forma afirmativa do outro lado, respondiam-nos com particular acervo e graves na voz: “Então, alista-te já na Marinha!” “Então, Junta-te à Força Aérea Portuguesa!”, aos fuzileiros, aos comandos, aos canhões. E nós, que acabáramos de ver o “Oficial e Cavalheiro” e pensávamos que era só vestir um fatinho branco, impecavelmente passado a ferro, sem mácula de esforço, sem nódoa alguma, para passear na rua e arranjar uma namorada que chorasse muito por nós quando embarcássemos, íamos sonhando com isso. Ou então vestíamos um casaco à Top Gun, uns óculos à Tom Cruise. E posto isto, sem capacete, lá íamos nós para a escola ao som de “Danger zone”. Cantando de cabelos ao vento cada uma das palavras de Danger Zone, imaginando que éramos o Tom Cruise naquela mota, sonhando que o mundo era sempre um final de tarde de verão a ouvir Danger Zone, acreditando que também pudéssemos entrar no bar e a loira lá no fundo reparar em nós, tal qual a do filme que se apaixona pelo casaco que agora se vende na feira, pelos óculos que “ são iguaizinhos ao que ele usa!”, pela banda sonora que tinha o “Danger zone”.


Mas tudo isto passou, a palavra caiu em desgraça e quase todas os termos que são muito jovens e tal, passaram de moda. Como se a juventude fosse uma moda passageira, uma espécie de “cubo mágico” do nosso crescimento, umas botas sendra, um isqueiro zippo. Daí que termos como “Malta” celebrizado por Júlio Isidro no Passeio dos Alegres e só agora usado pelo Avô cantigas, tenham ido por essa rua larga da decadência. Alguém que chegue a algum sítio nos dias de hoje e diga “Olá Malta!”, só poderá tratar-se de uma pessoa que terá consumido drogas a mais nos anos 80 e só agora tenha saído da cama do hospital - ou claro está – porque é o Avô cantigas. Porque já ninguém quer ser jovem, nem curtir bué uma alta cena. É pena, porque eu curtia tótil!

8 comments:

  1. Por acaso li a ontem (quinta) enquanto ia para o trabalho... Motivo para me deixar um sorriso nos lábios logo pela manha...

    Parabéns por essa crónica!

    Beijo

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  2. Alvim: lamento, mas corres o risco de cair na mesma categoria pelo simples facto de, calão incluído, escreveres português correcto. Sem x ou k em sítios indevidos e com todos os acentos perfilando-se precariamente equilibrados sobre as vogais às quais foram atribuídos.
    Quando a minha filha se saiu um dia destes com um "olha a vaca!" pensei que falava de alguém a quem tinha algum pó ou com quem tinha trocado uns tabefes; só verifiquei a magnitude do erro quando ela saiu do carro e se abraçaram as duas aos risinhos ...
    Portanto, se não quiseres parecer um fóssil, "terax ke xkrever axim" ...

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  3. Ultimamente está muito a dar, tudo o que seja Anos'80 - Colectâneas musicais, reposição de series, festas temáticas a animar as noites de Lisboa (que noutros lados não sei se há)...

    Mas tens razão... a palavra já não é o que era... Nem o Top Gun, nem o Oficial e Cavalheiro... Aliás, já nem o Tom Cruise é o que era!!!

    Mudam-se os tempos... e estamos "cotas".

    Mas eu continuo a "curtir bué.... uma alta cena"...

    Beijinhos

    T
    http://uma-musica-por-dia.blogspot.com/2008/05/1985-no-foram-s-coisas-ms-para-mim-foi.html

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  4. A gíria da nossa juventude desperta as emoções do tempo em que ela se usava. Faz parte de nós, como os desenhos animados que vimos e as roupas que usávamos.

    Em contraste, ficamos indiferentes, ou então, soam-nos ridículas as gírias das juventudes anteriores à nossa. Olha ali aquela "flausina"! Lá vai ele para o "laréu".

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  5. São coisas assim que me fazem sentir velha, caramba! Não é suposto sermos "velhos" quando começamos frases com "No meu tempo..."?

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  6. Eu curtir, curtir, curto tótil...
    Agora "jovem"... é muito mau.

    Detesto quando alguém começa a frase com "Jovem... coiso e tal".
    Acho até que tem um sentido um tanto depreciativo, não sei.

    Mas se calhar é porque estou a ficar velha. (quer dizer velha não, que velhos são os trapos, estou entradota, ou lá o que é que se diz nos tempos de hoje - Vou ali perguntar ao meu pré-adolescente e já venho).

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