Eu quero um país muito moderno como sempre foram as sapatarias Charles. Quero um país distinto, bem penteado, de casaquinho impecável, lencinho no bolso preparado para ir à madrinha buscar o folar da Páscoa. Eu quero que Portugal seja este país, que qualquer turista possa visitar a qualquer hora do dia ou do ano e tenha até receio de tocar com medo de partir, que isto de Portugal não é para todos. Eu quero futuro e dispenso bem o passado. É isso que ouviram. Orgulho-me do passado, tenho respeito por ele, mas morreu. O passado morreu e eu não acredito na reincarnação.
Quando muito na restauração, mas não é a mesma coisa. Devia haver até uma multa para cada português que falasse nos descobrimentos. Bastaria abrir a boca e dizer algo como "há 500 anos é que é era bom, o Vasco da Gama, o Bartolomeu Dias, o Pedro Alvares Cabral, o Diogo Cão eram pessoas fora de..." e nesse preciso instante uma autoridade qualquer, chegar-lhe-ia e perto e diria com tom austero " senhor está multado, são 1000 euros para a tosse, vamos embora!". E nada mais haveria a fazer. Era pagar a multa e tentar não falar mais do que se passou. Porque é esse o problema. Ficarmos agarrados ao passado, como se tudo o que nos tivesse acontecido fosse mais importante do que aquilo que nos pode ainda acontecer. O passado é sempre melhor, porque já aconteceu, já passou. O futuro é mais incómodo, porque é desconfortável não sabermos o que aí vem. O que muitos não se lembram, é que esses do passado a quem se referem em tom elogioso, souberam desafiar o futuro ao descobri-lo, ao antecipá-lo, ao fazê-lo chegar mais cedo. E é isto que distingue os audazes, provocar o futuro como quem provoca um parto, dilatando-o, sentindo as contracções, pegando no futuro ao alto, como um filho lindo que acaba de nascer.
Portugal tem que cheirar a acabadinho de nascer, a acabadinho de lavar, como uma camisa branca a sair das mãos da nossa mãe, ainda com o vapor quente nas mangas. Portugal tem que cheirar a limpo, cheirar a novo, para que tudo nele brilhe muito, reluza, tal qual o vestido que as meninas usam no baile de finalistas. Portugal tem que ser este vestido, essa camisa branca, esses colarinhos impecáveis e acintosos. Portugal não pode cheirar a mofo, nem a passado, nem a naftalina. Portugal tem que tresandar a futuro, a modernidade, a brilhantina. Portugal é muito mais amanhã, do que foi hoje.
Fotografia de Massimo Fuligni
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