Thursday, October 04, 2012

Um fórturo por inventar


Eu não quero este futuro, quero outro. Para mim este futuro é passado, esta maçã não presta, esta roupa já não serve. Recuso o futuro tal como mo dão, do mesmo modo que me ensinaram a recusar as verdades absolutas na escola e que me neguei muitas vezes a comer a sopa toda, embora os meus progenitores nunca o entendessem e me obrigassem a fazê-lo a muito custo com o ditatorial “come e cala”. Foi o meu tempo pide pós 25 de Abril. Quem disse que quem nasceu depois da revolução não conheceu o fascismo? Conheceu sim e foi em minha casa, à minha mesa. Mas agora não – quero que me imaginem a abanar muito a cabeça –, agora não, agora ninguém me vai obrigar a comer este futuro porque eu não o quero por mais que me o sirvam à boca em colherzinhas com “olha o aviãozinho”.  Não quero aviãozinho coisíssima nenhuma, quero sim cuspir este futuro em busca de outro, como quem escolhe fruta na mercearia e percebe que há muita que está demasiado madura. Este futuro está estragado e é preciso outro. E com urgência que eu tenho pressa. Eu quero um futuro à frente deste que o meu pé já cresceu e este não me calça. Quero um futuro por inventar – chamemos-lhe fórturo – um fórturo com chão brilhante e cheiro a lavanda. Quero um fórturo com banho acabadinho de tomar, um fórturo que nos empolgue e nos junte e nos faça jogar com a sorte que têm os campeões. É isso que Portugal precisa, um país com sorte de campeão mesmo que ainda não o seja. Mas que quer ser e todos o percebam. Mas para a ter, tem que acordar mais cedo, ir aos treinos, correr toda a manhã, toda a noite se assim for preciso, tem que acreditar que vai marcar golo nem que seja para lá da hora. E se assim for, a bola entra. E não me venham com o Ronaldo nem com o Mourinho nem a Nossa Senhora de Fátima. Temos que correr atrás da bola como se da vida se tratasse e não nos fiarmos mais na virgem. E o que fazer?, trincar os dentes, a língua, uma sandes de fiambre, o que for, até que o estádio salte. E assim mudaremos de futuro, rejeitando este que não nos serve para nada e bebendo este fórturo que será feito por nós.

Fernando Alvim
Publicado originalmente no jornal i

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